Há 398 milhões de anos, na primeira fase do Devoniano, a flora sofreu uma revolução que teria fortes implicações para o futuro do planeta. As primeiras plantas começaram a ganhar corpo ( virar árvores).
Para minha surpresa, as árvores mais antigas do planeta tinham uma morfologia MAIS complexa do que existe hoje, de acordo com um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Cardiff, e transformaram-se em densas florestas que se alastraram pelos protocontinentes.
Na falta de animais herbívoros, nada as ameaçava: as árvores eram as soberanas da Terra. À medida que sequestravam o carbono da atmosfera e lançavam grandes quantidades de oxigênio, modificavam o clima para sempre, abrindo caminho para o surgimento de formas de vida mais complexas.
IMPORTANTE PARA BOTÂNICOS E AMANTES DE PLANTAS:
O período coincide com a expansão da vegetação terrestre. As primeiras florestas da Terra influenciaram o ecossistema do planeta. Um estudo publicado na revista Nature reconstitui esses ambientes ancestrais, a partir da retomada de escavações do fim do século 19 em Gilboa, no estado norte-americano de Nova York.
Lá, encontra-se o mais antigo conjunto de fósseis vegetais já descobertos, formado por centenas de árvores da extinta espécie Eospermatopteris eriana, da qual fazem parte as gigantes cladoxylopsidas.
Na floresta petrificada de Gilboa se descobriu uma área de 1,2 mil metros quadrados, onde foram identificados três tipos de plantas que podem solucionar os mistérios da ecologia ancestral. A floresta de Gilboa é um ícone desde que os primeiros fósseis vegetais foram encontrados por baixo de densas camadas de arenito.
Os fósseis revelaram que as florestas ancestrais não eram simples, mas ecossistemas complexos, com plantas interagindo umas com as outras. Além das já conhecidas cladoxylopsidas, há registros em Gilboa de outras duas plantas, com diferentes padrões de crescimento, distribuição e histórico evolutivo. Uma delas pertence ao extinto grupo Aneurophytalean progymnosperms.
Eram plantas rizomatosas, com caules subterrâneos, constituindo uma vegetação rasteira. A terceira era uma árvore menor, com cerca de 1m de altura, mas os fósseis estavam muito fragmentados, então não conseguimos encaixá-la em nenhuma espécie. Ela se assemelha ao grupo das lycopsidas, que habitaram campos carboníferos no passado.O entendimento da biodiversidade de
Mas o que caracteriza uma árvore? Seu tamanho? Ou possuir um lenho com crescimento secundário, ou seja, no qual se formam anéis de crescimento com o passar do tempo? Se for pelo tamanho, as primeiras árvores apresentavam um formato que lembra as palmeiras de hoje, sendo incluídas dentro dos gêneros Gilboaphyton e Eospermatopteris, cujos fósseis são encontrados perto de Nova Iorque, nos Estados Unidos e no norte da Venezuela, na cordilheira de Perijá. O surgimento da possibilidade de ramificação abriu novas possibilidades, assim como o desenvolvimento de sistemas radicular e vascular mais eficientes. Tudo isso aconteceu, pelo registro que se tem, durante o transcurso da segunda metade do período Devoniano, entre 398 e 385 milhões de anos atrás. O desenvolvimento desse novo tipo de vegetais, as árvores, trouxe profundas mudanças aos ecossistemas continentais, tanto pelo surgimento das florestas e com elas novas possibilidades a vida, quanto para o ciclo do carbono, intemperismo das rochas, estabilização da erosão, balanço do CO2 e consequentemente do clima. As primeiras florestas possivelmente viviam próximo aos cursos de água, de forma semelhante às florestas ciliares que hoje em dia acompanham o curso dos rios.
Os sistemas radiculares (raízes) que se tornaram mais efetivos, complexos e profundos. Esses avanços trouxeram como consequência o desenvolvimento de solos com conteúdo orgânico, bem como a intensificação do intemperismo químico do entorno abiótico que rodeava as raízes. Por sua vez, as raízes desde o inicio já apresentavam uma associação com uma classe especial de fungos denominada como micorrizas, hoje presentes em 90% dos vegetais, e que auxiliam na obtenção de nutrientes do solo e, portanto, na alteração química das rochas. Outra ventagem do advento de sistemas radiculares maiores foi a diminuição da erosão e como consequência, da quantidade de sedimentos que era incorporada aos sistemas fluviais e costeiros.
Sistemas radiculares maiores e mais complexos, juntamente com o surgimento de um sistema vascular formado por tubos ou traqueídes com paredes agora lignificadas e provistas de perfurações para auxiliar na melhorar a circulação de água e nutrientes por todo o corpo do vegetal, permitiram também a sustentação de uma porção aérea maior em altura e com maior área de copa. Essas melhorias permitiram que os vegetais alcançassem vários metros de altura e aumentassem consideravelmente o seu tempo de vida, abrindo um novo capítulo nos ecossistemas terrestres e oferecendo proteção dos raios solares e mais umidade.
Registros de paleosolos devonianos que se desenvolveram em ambientes costeiros e fluviais são uma das evidências acerca do desenvolvimento e sofisticação dos sistemas radiculares, pois neles foram preservados moldes das raízes ou raízes permineralizadas junto com as micorrizas.
Esse período é fundamental para compreender a vegetação atual. “Muitas das características morfológicas e anatômicas que prevalecem na flora contemporânea fizeram suas primeiras aparições nesse período. O tamanho e a diversidade dos fósseis de Gilboa são significativos para pesquisas que buscam solucionar o mistério da evolução das plantas na Terra”.
Mas calma: essas primeiras árvores ainda não possuam uma reprodução por meio de sementes e, portanto, grandes áreas no interior dos continentes ainda continuavam a desabitadas. As primeiras sementes surgiram no período seguinte, conhecido como Carbonífero, e com elas a possibilidade das florestas cobrirem as terras emersas até hoje.
Quando se fala em fósseis, as pessoas imaginam dinossauros, mamutes, preguiças-gigantes, mas a vegetação fossilizada é tão importante quanto a fauna para compreendermos a história da Terra.
O aparecimento de densas florestas implica modelos climáticos completamente novos. Menos carbono na atmosfera, mais oxigênio liberado, aumento das precipitações, tudo isso foi fundamental para que a vida complexa saísse dos oceanos e começasse a se aventurar por um ambiente até então pouco favorável, mas que dá os primeiros passos para abrigar novas espécies e preparar o terreno para a aparição, dali a milhões de anos, do Homo sapiens.
Bibliografia:
RAVEN, P.H., EVERT, R.F. & EICHHORN, S.E. 2007. Biologia Vegetal, 7a. ed. Coord. Trad. J.E.Kraus. Editora Guanabara Koogan, Rio de Janeiro.Surprisingly complex community discovered in the mid-Devonian fossil forest at Gilboa: https://www.nature.com/articles/nature10819https://www.nature.com/articles/483041a?draft=journal#f1https://www.infobae.com/economia/rse/2017/10/25/los-arboles-mas-antiguos-del-planeta-eran-mas-complejos-de-lo-que-se-pensaba/https://www.pnas.org/content/early/2017/10/18/1708241114.abstract?sid=26b43f40-c914-4adf-b55d-ff8bc6df9b53http://www.devoniantimes.org/who/pages/ferns.htmlhttp://scienceandevolution.blogspot.com/2007/12/how-trees-changed-world.html
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