Desde os 11 anos que eu gosto de poesia. A professora pediu para que eu escrevesse uma poesia, e não saiu nada, apesar do esforço daquela primeira tentativa escolar. Eu lembro de fechar os olhos e tentar extrair algo, foram horas frustrantes. Até que começou a brotar algo, um vago sentimento, uma palavra, uma frase e de repente um poema, sem rima, sem métricas e sem regras, mas saiu um primeiro poema. Dai para diante não parei mais de fazer textos, poesias e as vezes apenas pensamentos soltos. Eu confesso que as vezes eu escuto vozes e sussurros, e que eu os coloco no papel sempre à lápis.
“Você pode resolver todos os problemas do mundo em um jardim.”
Geoff Lawton
Essa história de poesia no jardim começou meio tarde na minha vida, até porque a jardinagem eu só comecei a praticar mesmo depois dos 20 anos. Comecei a olhar para as plantas de verdade, durante um curso onde um médico me apresentou a “fenomenologia de Goethe”, um poeta, que era também um estudioso do mundo natural. Fiz um vídeo sobre esse tema, enquanto falava sobre a minha flor preferida, veja mais:
No poema abaixo do poeta Fernando Pessoa, nos fala sobre o jardim e claro que não está apenas falando apenas do jardim, mas sobre ele e sobre você.
Cerca de Grandes Muros Quem te Sonhas
Cerca de grandes muros quem te sonhas.
Depois, onde é visível o jardim
Através do portão de grade dada,
Põe quantas flores são as mais risonhas,
Para que te conheçam só assim.
Onde ninguém o vir não ponhas nada.
Faze canteiros como os que outros têm,
Onde os olhares possam entrever
O teu jardim com lho vais mostrar.
Mas onde és teu, e nunca o vê ninguém,
Deixa as flores que vêm do chão crescer
E deixa as ervas naturais medrar.
Faze de ti um duplo ser guardado;
E que ninguém, que veja e fite, possa
Saber mais que um jardim de quem tu és –
Um jardim ostensivo e reservado,
Por trás do qual a flor nativa roça
A erva tão pobre que nem tu a vês…
Fernando Pessoa, in ‘Cancioneiro’
Exercício poético no jardim
Vá ao jardim com lápis e papel. Pare, olhe, escute e respire. Tente se integrar ao local , fique assim pelo tempo que quiser, respire. Deixe seus olhos repousarem sobre as formas, cores, pelas partes e pelo todo. Respire profundamente, abra seus cinco sentidos e deixe as sensações e palavras fluírem em um desenho, em uma palavra, uma frase, uma ideia solta, apenas não questione. Por mais boba que seja, por mais simples que seja esse poema semente. Fique assim pelo tempo que quiser, respire sempre e profundamente, abra seus sentidos e percepções. Repita esse exercício por alguns minutos ao longo do dia em diferentes horários e períodos, repita em meses diferentes em diversas estações, com sol, chuva, frio, com vento, ventania, trovoadas, nuvens, céu azul, céu pesado , céu cinza, de dia e noite, manhã, tarde e noite. Perceba as plantas e a fauna. Namore o seu jardim com os olhos. Se divirta com o resultado, quando estiver pronto, mostre para os outros.
O poeta Manoel de Barros é um mestre nesta arte, veja só esse poema dele, se deleite com as poesias desse grande observador:
Aquele homem falava com as árvores e com as águas
ao jeito que namorasse.
Todos os dias
ele arrumava as tardes para os lírios dormirem.
Usava um velho regador para molhar todas as
manhãs os rios e as árvores da beira.
Dizia que era abençoado pelas rãs e pelos
pássaros.
A gente acreditava por alto.
Assistira certa vez um caracol vegetar-se
na pedra
mas não levou susto.
Porque estudara antes sobre os fósseis linguísticos
e nesses estudos encontrou muitas vezes caracóis
vegetados em pedras.
Era muito encontrável isso naquele tempo.
Até pedra criava rabo!
A natureza era inocente.
P.S:
Escrever em Absurdez faz causa para poesia
Eu falo e escrevo Absurdez.
Me sinto emancipado.
Manoel de Barros